O Bitcoin acabará com os as grandes corporações – e isso é bom

Uma das principais mudanças que ocorre na mentalidade financeira de pessoas que passam a estudar o Bitcoin é entender que, apesar do imenso potencial de retorno que ele pode trazer ao longo do tempo, a principal característica deste ativo é a manutenção do poder de compra real.

Isso porque o Bitcoin, com uma quantidade de moedas máxima de 21 milhões, não pode ser inflacionada – ou seja, não podem ser geradas mais unidades além da quantidade programada inicialmente.

Isso significa que, uma vez que todas as 21 milhões de moedas tenham sido mineradas, a quantidade de moedas em circulação não aumentará. Para que elas aumentem, todos os participantes da rede deveriam concordar em aumentar o supply de moedas – mas por que alguém faria isso e aceitaria diluir a própria riqueza?

Ao contrário: a quantidade de Bitcoin disponível só diminuirá, uma vez que continuarão ocorrendo perdas de valores dessa criptomoeda, ainda que numa quantidade menor do que nos primeiros anos de existência da criptomoeda. Isso gera o primeiro dinheiro verdadeiramente deflacionário do mundo.

Mudanças que o Bitcoin trará no crescimento das empresas

A característica do Bitcoin como moeda deflacionária traz uma série de mudanças de paradigma na economia global, como já falam grandes mentes do meio bitcoiner, como Michael Saylor, Jeff Booth e tantos outros.

Mas uma recente entrevista de Michael Saylor[1] um me fez perceber uma mudança grandiosa que o Bitcoin pode trazer na economia global: a diminuição progressiva de megacompanhias globais.

Não digo que elas serão exterminadas definitivamente, nem digo que essa mudança será rápida. Ao contrário: acredito que ela ocorrerá de maneira progressiva, juntamente com a adoção gradual do Bitcoin.

Mas, afinal, por que o Bitcoin seria capaz de causar uma mudança global tão gigantesca?

Processo Inflacionário x Bitcoin

Pense comigo: vivemos em um sistema inflacionário, em que o poder das moedas emitidas por governos diminui dia após dia, uma vez que os Estados ao redor do mundo emitem cada vez mais moedas para pagar suas dívidas.

Isso faz que, com uma mesma quantidade de riqueza na economia e mais moeda circulando, seja natural que o dinheiro perca valor ao longo do tempo – esse, em resumo, é o mecanismo por trás do processo de inflação, tão bem descrito por Ludwig von Mises[2].

Por exemplo: considere que exista um país 100 bilhões de moedas em circulação na economia, sendo que o seu governo possui 10 bilhões dessas moedas. De um dia para o outro, esse governo local emite 10 bilhões de moedas, gerando um aumento de 10% na base monetária, mesmo que a atividade econômica permaneça a mesma.

Como resultado, quem emitiu a moeda (o governo), passa a ter 20 bilhões de moedas de um total de 110 bilhões, aumentando sua riqueza proporcional de 10% da economia total para 18% num “passe de mágica” – com isso, os outros participantes da economia têm seu poder diluído.

Com o governo tendo mais dinheiro, ele pode comprar mais coisas através de suas inúmeras instituições, dar dinheiro para “amigos do rei”, iniciar projetos sem preocupação orçamentária (afinal, se tudo der errado, é só imprimir mais), entre outras ações.

Diluição da Moeda e Empreendedorismo

Com o governo diluindo cada vez mais o seu capital, o que o empreendedor faz? Precisa ficar cada vez mais agressivo para manter seu poder de compra. Em um sistema deflacionário com base no Bitcoin, onde não há mais impressão de dinheiro e a quantidade de moedas é constante na economia, ele pode guardar certa parte de seu lucro em caixa e não se preocupar tanto em manter seu poder de compra.

Mas com uma economia que dilui o seu poder de compra de maneira cada vez mais frequente – basta ver os níveis estratosféricos de impressão monetária no mundo todo a partir de março de 2020[3], com o distanciamento social –, não basta apenas “guardar dinheiro”, pois ele perde valor dia após dia.

Isso considerando também que a inflação real é maior do que a inflação reportada, com diversas manipulações no índice de preços para mitigar os resultados oficiais de inflação[4]. Como resultado, o empreendedor precisa fazer seu dinheiro render mais.

Isso faz com que, por exemplo, ele aplique seu caixa em produtos financeiros, como ativos de renda fixa ou renda variável. Ou seja: o que era para ser um investimento, com riscos associados e possibilidade de se perder o capital investido, passa a se tornar algo quase que obrigatório para não se perder dinheiro.

E no mundo dos negócios, o que o empreendedor TAMBÉM pode fazer? Ao invés de deixar certa parte do lucro em caixa na empresa, ele começa a investir em projetos novos (através de mecanismos como Private Equity e Venture Capital), adquirir negócios de menor porte, realizar fusões com concorrentes, entre tantas outras medidas que geram a centralização de poder econômico na mãos de poucas pessoas.

Basta ver a realidade ao redor: quantos de nós não vimos, nas últimas décadas, marcas locais de comida e bebida sendo compradas por empresas maiores? Empresas grandes precisam dar satisfação aos acionistas e, por isso, muitas vezes precisam fazer jogadas perigosas de investimentos, buscando um retorno positivo cada vez maior para conseguir acompanhar a inflação.

Bitcoin como verdadeira reserva de valor

Se não fosse pela inflação, seria possível manter um lucro crescente e constante sem necessitar um crescimento tão constante nas operações: seria possível deixar parte do caixa em uma moeda deflacionária (como o Bitcoin) e continuar suas operações.

Como já foi dito, o Bitcoin possui em sua programação um supply máximo de 21 milhões. E como isso só poderia ser mudado com um consenso entre todos os nós da rede, é praticamente impossível que venhamos a ter mais unidades além do programado inicialmente.

Até porque, se você é um participante da rede e já possui bitcoins, por que você escolheria gerar mais unidades e, com isso, perder poder de compra? Esse é um incentivo financeiro para que a quantidade de bitcoins na economia nunca vá além do estabelecido no começo.

Em um mundo em que o Bitcoin já esteja perfeitamente inserido na economia, um novo empreendimento precisaria render mais do que a valorização natural desta moeda para ser lucrativo.

Dessa forma, inúmeros empreendedores estarão plenamente satisfeitos em, ao invés de crescer os seus negócios, simplesmente manter seu caixa em moeda forte ao invés de querer se tornar uma das 500 maiores empresas do mundo.

Isso faria com que menos negócios em crescimento começassem a comprar empresas menores de maneira desenfreada. Dessa forma, menos negócios locais seriam comprados por grandes corporações.

Dessa forma, teríamos uma maior diversidade de negócios locais existentes, com menor concentração de renda e poder na mão de poucos. Assim, teríamos um inventivo econômico natural para um capitalismo menos monopolista e, por assim dizer, mais justo.

Vantagens para a Esquerda e a Direita

O curioso é que esse processo pode ser considerado benéfico tanto para a esquerda quanto para a direita.

Para a direita, ocorrerá uma maior especialização do trabalho, de maneira que haja várias empresas menores especializadas em setores distintos, gerando assim mais eficiência.

Para a esquerda, a diminuição das grandes corporações pode diminuir a concentração de renda na mão de poucos e diminuir a desigualdade de maneira orgânica.

O Bitcoin e as Megacorporações

Mas isso tudo só explica uma parte do processo. Mas e as megacorporações que já existem? Como elas poderiam diminuir de tamanho de maneira orgânica através do Bitcoin? É o que vamos ver. Mas, para isso, precisamos primeiro entender dois conceitos-chave.

1. Lei dos Rendimentos Decrescentes

O primeiro de todos é a lei dos rendimentos decrescentes. Essa é uma lei da economia que fiz que, quanto mais a empresa vai crescendo de tamanho, mais difícil é para ela conseguir manter um retorno crescente ou até mesmo estável. Ou seja: por mais que ela vá crescendo seu tamanho e aumentando seu faturamento bruto, o que sobra no fim do dia (ou seja, a sua margem de lucro) vai diminuindo conforme ela aumenta.

Ou seja, uma empresa A pode ter uma margem de lucro de 20%, mas, ao longo dos anos, cresceu tanto que só consegue manter uma margem de lucro de 5%. isso significa que, de tudo que ela produz, só restam 5% no bolso no fim das contas.

Alguns podem se questionar se essa regra se aplica às big techs, e isso é questionável, já que a margem de lucro de gigantes como Google e Meta é altíssima. No entanto, isso é válido para a maioria das indústrias.

2. Taxa Livre de Risco

O segundo conceito importante para se entender é a taxa livre de risco. Geralmente, se dá o nome dessa taxa à uma taxa muito segura, através da qual se considera que não há risco ao investir. No mundo atual, essa taxa mais segura é a de emprestar dinheiro ao governo americana – ou seja, a taxa livre de risco é a taxa que se ganha ao investir em títulos da dívida americana. Isso quer dizer que o ente com mais capacidade de honrar suas dívidas, o governo dos EUA, possui uma taxa de juros que é considerada a base, o ativo com risco 0, de maneira que seu dinheiro “está 100% seguro nesse investimento”.

Se ele está, de fato, totalmente seguro não é a intenção de se discutir aqui, mas o que importa é que toda a economia global fica dependente do cenário de juros americano. Quando essa taxa de juros está baixíssima, fica fácil para empresas tomarem crédito e crescerem seus negócios; mas, quando a taxa está muito alta, a tomada de crédito é difícil, uma vez que é mais fácil simplesmente deixar dinheiro em títulos de dívida americana.

Para ilustrar esse conceito de taxa livre de risco, considere o seguinte exemplo: se a taxa básica de juros dos EUA é de 1% ao ano, basta que meu empreendimento renda mais que esse valor pra que meu negócio seja viável economicamente. Porém, se a taxa for de 10% ao ano, os empreendimentos precisariam render mais do que 10% ao ano para valer a pena o investimento, algo bem mais difícil.

Bitcoin como Taxa Livre de Risco

Usamos a taxa de juros americana como base para a economia global. Mas e se o Bitcoin viesse a ocupar esse espaço? Como será viável deixar dinheiro em Bitcoin em caixa, é possível que ela se torne a taxa livre de risco em algum momento no futuro.

Uma vez que todo o Bitcoin tenha sido minerado e esteja em circulação, qual será a taxa livre de risco? Certamente será maior do que 1 ou 2%, cenários de juros baixíssimos que geraram diversas distorções no mundo dos negócios, como as grandes empresas unicórnios que nunca deram lucro e continuam rodando.

Não faço ideia de quanto será a taxa de valorização anual do Bitcoin uma vez que ele tenha se tornado estável (algo que possivelmente vai ocorrer no futuro), mas, diante da perda de valor das moedas estatais e da perna natural de Bitcoin que ocorre ao longo dos anos, é seguro dizer que valerá bem mais a pena deixar dinheiro em caixa do que investir em setores improdutivos.

Mas no que isso impacta na diminuição das megacorporações? Simples: como haverá um prêmio monetário para deixar o dinheiro em Bitcoin ao investir em projetos duvidosos e pouco rentáveis, será mais vantajoso que essas companhias vendam a porção menos lucrativa de seus negócios e armazenem o dinheiro dessa venda em Bitcoin.

Assim, empresas menores poderão comprar esses negócios e torná-los mais eficientes, colocando em prática o princípio da especialização do trabalho de Adam Smith, que afirma que é natural que determinados entes econômicos se especializem em determinadas atividades.

Com isso, haverá cada vez menos companhias que colocam suas mãos em diversas áreas ao mesmo tempo, pois estas verificarão que é mais rentável simplesmente manter-se em seu círculo de competência, diminuindo assim não só a agressividade na expansão de negócios, mas até mesmo reduzindo seu tamanho.

Disclaimers

De fato, ainda é questionável se a existência do Bitcoin seria capaz de diminuir naturalmente o tamanho das grandes corporações que têm por objetivo, para além da motivação financeira, o alcance de poder global em questão política e social. Acredito que sim, mas ainda preciso estudar mais.

Seja como for, a adoção desta criptomoeda pode ser a maneira mais eficiente e natural de desconcentrar o poder na mão de poucos.

Referências

[1] Bitcoin Revolutionizes Corporate Finance | Michael Saylor

[2] Mises – As 6 Lições

[3] The increase in the money supply during the Covid crisis: analysis and implications

[4] O que é INFLAÇÃO, quais as CAUSAS e como os índices DISTORCEM a realidade e AFETAM o SEU bolso

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