(Imagem encontrada aqui)
Basta saber um pouco de mitologia para compreender que os nomes dos planetas do sistema solar são baseados nas divindades do Império Romano, com cada planeta possuindo um nome romano que remete a alguma característica intrínseca a ele.
No entanto, nem sempre os planetas tiveram seus nomes atuais: antes da nomenclatura que possuem hoje, eram usados os nomes das divindades gregas: Hermes, Afrodite, Zeus… e antes mesmo disso, eram usados os nomes das divindades sumérias – povo que construiu as bases da astrologia ocidental.
Mas, por algum motivo, esses nomes não foram adaptados para nomes de santos católicos durante a Idade Média – algo que seria de se esperar, uma vez que o cristianismo sempre adaptou elementos de culturas pagãs em sua própria cultura, cristianizando-os, por assim dizer.
Talvez seja pelo fato de, pouco a pouco, a Igreja ter se distanciado da astrologia tradicional – algo que ocorreu pelo menos desde Santo Agostinho. Não sei se há resposta para esses nomes terem se mantido intactos, mas o fato é que os planetas continuaram com a nomenclatura romana mesmo depois da predominância da fé cristã no ocidente.
Como objeto de estudo, decidi relacionar os planetas da astrologia tradicional com grandes santos do princípio do cristianismo com base nas características que chamam mais a atenção em ambos.
Dei preferência para santos que conviveram diretamente com Jesus Cristo ou que, pelo menos, são apresentados no Novo Testamento. Dessa maneira, temos uma simbologia válida para a Igreja em todos os tempos de sua história.
Mercúrio — São João Batista
Mercúrio (Hermes, na mitologia grega) é o mensageiro dos deuses, aquele que faz saber os desígnios de Zeus. Da mesma forma, São João Batista foi o último profeta antes de Cristo, aquele que deveria vir para prenunciar a chegada do Messias.
A figura de São João Batista faz sentido como primeiro planeta do sistema solar, pois ele veio antes para preparar o povo de Deus para a chegada do verdadeiro Salvador – ou seja, para o que viria depois dele.
A correlação aqui é clara: ele veio como um mensageiro de Jesus, preparando o povo eleito para a Nova Aliança com Deus. Ele veio, pregando e se tornando conhecido, tudo isso para voltar sua mensagem ao verdadeiro Messias: Jesus Cristo, seu primo.
João Batista era um mensageiro silencioso, que morreu por permanecer firme na fé de maneira humilhante para muitos, mas que serviu para regar as sementes da fé com seu sangue.
Antigamente, sua figura era importantíssima no cristianismo, mas com o tempo sua importância foi diminuindo, dando mais espaço a outros santos e devoções no seio da Igreja – mostrando que o melhor mensageiro é aquele que não atrai para si a atenção, e sim para a mensagem.
Vênus — Santa Maria Madalena
Vênus é um planeta tipicamente feminino, estando relacionado com a deusa do amor, da fertilidade, e da relação sexual, sendo conhecida como Afrodite na mitologia grega.
Inicialmente, pareceu difícil achar uma correlação apropriada de algum santo com este planeta, por conta de sua simbologia mais voltada ao amor Eros, passional. Uma possibilidade seria São João Evangelista, o “discípulo amado”, que apresenta o amor enquanto caridade de maneira muito ressaltada em suas Epístolas – e que, além disso, foi fiel a Cristo até o momento de sua crucificação.
No entanto, como planeta feminino, esta comparação seria imperfeita. Além disso, há alguém muito mais propício para a comparação – alguém que também ficou junto a Cristo enquanto ele agonizava na cruz: Santa Maria Madalena.
Aqui, há a imagem de um amor que transforma: Maria Madalena, sendo associada à mulher adúltera nos Evangelhos, largou sua vida pregressa e decidiu transformar sua vida num ato de seguir os passos de Cristo, lutando contra suas inclinações e adquirindo uma nova postura diante da vida.
Vale fazer uma pequena observação a respeito da figura de Santa Maria Madalena: apesar dela estar associada à mulher adúltera que quase foi apedrejada por conta de sua infidelidade, não há nenhum relato bíblico que afirme que estas duas mulheres eram a mesma pessoa. Pelo contrário: imagina-se que Maria Madalena era uma mulher de posses que ajudou financeiramente Jesus em sua missão.
No entanto, a analogia ainda vale enquanto símbolo, ainda que careça de veracidade histórica.
Lua — Nossa Senhora
A Lua costuma apresentar uma simbólica feminina, relacionada à figura da mãe, do amor maternal e da esposa, sendo sempre a companheira do Sol. Esses aspectos maternais remetem diretamente à mãe de Cristo: Virgem Maria.
Ela é quem está ao lado do Sol em tudo, atuando de maneira menos visível e até mesmo menos importante, mas também fundamental para uma vida na fé – assim como a Lua, mesmo sendo muito menor em tamanho quando comparado ao Sol, ainda é fundamental refletir a luz solar.
A referência a Nossa Senhora é muito evidente até mesmo considerando elementos sutis, como as vestes brancas e azuis com a qual ela é comumente apresentada – ambas associadas à Lua, um planeta branco e com brilho azulado.
A Virgem Maria possui diversos títulos relacionados à sua santidade. Para esta comparação, vale a pena destacar o título de “Estrela do Mar”: a Lua, segundo a concepção da astrologia tradicional, é uma estrela (assim como os outros planetas do sistema solar), e é ela quem regula as marés, tornando ainda mais nítido o simbolismo das cores branco e azul.
Sol — Jesus Cristo
Na maioria das línguas latinas, os dias das semanas estão relacionados com os planetas da Astrologia Tradicional: são sete planetas, um para cada dia da semana. O domingo é o dia relacionado ao Sol e, bem no começo da história cristã, substituiu o sábado como dia de repouso, mostrando de forma clara a relação direta apresentada aqui.
O Sol, sendo a estrela mais importante dentro da astrologia, merece a relação mais direta com Nosso Senhor Jesus Cristo. É o Sol quem possibilita nossa vida, renova nossas energias e que surge a cada dia após uma longa noite.
Da mesma forma, Cristo nos dá as energias necessárias a cada dia por meio da sua Graça – não por merecimento nosso, mas por pura misericórdia Sua. A graça de Deus é como os raios solares, que nascem pela manhã tanto para o justo quanto para o injusto.
Terra — São Pedro
São Pedro é a pedra sobre a qual foi edificada a Igreja, sobre a qual ela se sustenta. O planeta Terra é onde vivemos, onde pisamos todos os dias e com o qual nos sustentamos. Da mesma forma que São Pedro é, como primeiro papa, nosso fundamento institucional enquanto religião, a Terra funciona como nosso fundamento material.
Pedro era um pescador, um homem humilde e com trabalho simples. Cometeu erros durante o tempo em que aprendeu com Jesus diretamente, mas mesmo assim foi chamado a se arrepender e a apascentar as ovelhas do rebanho de Cristo. São Pedro representa nosso chamado diário a viver a santidade de nosso dia a dia aqui na Terra, sempre ajustando o caminho conforme necessário.
Marte — São Miguel Arcanjo
A Igreja tem diversos santos guerreiros em sua história. Para citar alguns: São Sebastião, São Jorge, Santo Expedito… mas, dentre todos, o que merece mais destaque é certamente São Miguel Arcanjo.
É São Miguel o príncipe da milícia celeste: ele que, mesmo sendo do segundo nível mais baixo dentro da hierarquia de anjos, comanda o exército angélico contra as forças do mal e pisa na cabeça do demônio ao final da batalha.
São Miguel é apresentado no Apocalipse e, desta maneira, é o que está mais relacionado com os relatos bíblicos. Além disso, ele é padroeiro de toda a Igreja Católica, motivo que ressalta sua importância frente a outros santos guerreiros.
Enquanto Marte (Ares) comanda guerras em favor próprio e de seus favoritos, São Miguel comanda o exército de anjos em uma batalha espiritual na qual a vitória é certa graças à misericórdia de Deus.
Júpiter — São Paulo
Júpiter (Zeus) é o chefe do Olimpo, o líder dos deuses. Apesar desta figura estar mais diretamente relacionada com Deus Pai – e, consequentemente, a Jesus Cristo, seu Filho –, parece que a simbólica está também diretamente relacionada a São Paulo.
Ainda que Cristo seja o Messias e tenha nos redimido, ou que São Pedro seja o novo papa e tenha exercido a liderança institucional da Igreja, não há de se negar que ele foi o mais importante teólogo da história do cristianismo, influenciando diretamente inúmeras comunidades do cristianismo desde os primeiros séculos – feito que o tornou o autor com mais obras escritas no Novo Testamento.
Além disso, São Paulo foi um pregador incansável, tendo fundado diversas comunidades no cristianismo nascente no primeiro século, o que possibilitou a difusão da Boa Nova a diversos cantos do planeta. Júpiter é um planeta gasoso e o gás é o estado da matéria que mais facilmente se difunde em condições normais, mostrando assim a relação entre a figura de Paulo e as características físico-químicas do planeta.
Curiosamente, o nome “Paulo” significa pequeno. Ao mesmo tempo, Júpiter é o maior planeta do sistema solar. Esta curiosa comparação mostra que mesmo um homem pequeno, endurecido e perseguidor pode se tornar um grande santo, levando a palavra de Cristo para o todo mundo e se tornando um dos maiores nomes da fé cristã por meio de sua grandeza espiritual.
Saturno — São José
Saturno (Cronos, na mitologia grega), foi o Titã que gerou Zeus e seus irmãos. Ele está relacionado com a figura do homem enquanto pai, enquanto figura de autoridade. Ao invés de ser o homem enquanto rei, dominador, é aquele homem mais velho, que chegou à sabedoria e governa pelos conselhos ao invés do poder.
A figura paterna mais evidente no Novo Testamento – fora o próprio Deus Pai – é São José, pai da Sagrada Família que cuidou de Jesus até sua morte, antes do início de Sua pregação pública.
São José que, mesmo sendo o menor da Sagrada Família, foi encarregado de cuidar dela, e o fez até os últimos dias de sua vida. Ele que certamente educou Jesus nos princípios da fé judaica e compartilhou seus dias com Cristo, ensinando-O por meio do trabalho com esmero, da paciência com seus clientes, das relações familiares e inúmeras outras circunstâncias do dia a dia.
Conclusão
Parece muito claro que é possível relacionar as figuras dentro do cristianismo com os planetas da astrologia tradicional. Há ainda outras relações possíveis, considerando outros santos existentes ao longo dos séculos que também apresentem os mesmos arquétipos dos planetas estudados.
Seria possível, por exemplo, fazer uma correlação deste tipo apenas com santos descritos no cânon romano (atualmente conhecido como oração eucarística I), ou apenas com papas importantes na história, ou apenas com doutores da Igreja…
As comparações são muitas, mas para efeitos práticos e de abrangência universal, é preferível o uso de santos descritos no Novo Testamento, de maneira que os arquétipos alcancem seu objetivo de serem os mais universais possíveis.
Como bem disse uma amiga minha ao ler esse texto, não é possível comparar diretamente as divindades mitológicas com os santos, pois os últimos existiram de verdade e não são construções arquetípicas – ou seja, nunca se enquadrarão perfeitamente nos simbolismos ligados a cada planeta. Mesmo assim, creio ser uma comparação interessante de um ponto de vista simbólico.