Jiu-Jitsu, Justiça e Igualdade

O jiu-jitsu é a atividade mais justa de todas. Não só o jiu-jitsu, mas todas as artes marciais, quando levadas a sério.

Não há distinção de classe social. Na minha academia, tem de tudo: policial civil, policial militar, delegado, miliciano, motoboy, Uber, professor, instrutor de academia… tudo o que você pode imaginar. Não importa onde você foi no colégio, onde você fez faculdade – ou se você fez faculdade –, onde você trabalha, quanto você ganha… Se você pode pagar o valor da mensalidade, você pode treinar.

Ninguém pergunta com o que você trabalha. Só depois de muito tempo e conversa é que esse tipo de assunto surge. No geral, vocês conversam sobre novas posições, como evitar ser finalizado e sobre o desempenho da equipe em campeonatos, além de determinadas brincadeiras bobas, pra aliviar o clima.

No tatame, só uma coisa importa: o seu treino. A sua técnica, a sua força, o seu condicionamento físico, a sua disciplina. Não importa se você tem assuntos interessantes pra conversar ou se entra mudo e sai calado: o que importa é como você se comporta naqueles 5 minutos de rola. Durante esses 300 segundos, a sua mente entra em estado automático e, por mais que você tenha que pensar em qual estratégia tomar diante do oponente, eventualmente as coisas começam a progredir de maneira fluida.

Você fala com pessoas de todos os tipos: das mais humildes às mais abastadas; das mais extrovertidas aos mais recolhidos; dos adolescentes de 14 anos até pessoas com mais de 60; de todos os tipos de ideologias e visão de mundo que, diante da arte suave, passam a não importar mais (ao menos naquela uma hora e meia de treino).

Muito embora o jiu-jitsu e as outras artes marciais possuam um sistema de faixas que demonstra uma escala hierárquica bem definida, não é como se houvesse arrogância por parte dos mais graduados (como são chamados os mais experientes). Na verdade, eles sempre estão dispostos a ensinar os mais iniciantes, sabendo quando e com quem podem pegar mais pesado ou mais leve no treino. É um ambiente de hierarquia, mas de igualdade social, em um certo sentido.

Essa justiça faz com que o jiu-jitsu molde o caráter do homem, fazendo-a entender que, por mais que ele tenha uma grande posição profissional e social fora dali, no tatame ele é só mais um praticante, como qualquer outro. Você entende que dinheiro e status não podem te salvar quando uma pessoa com metade do seu peso é capaz de te derrubar em menos de 10 segundos. Depois de ser finalizado em menos de um minuto por um garoto com 15 anos a menos do que você, é impossível que seu ego não seja ferido . É aí que você percebe que isso não é um problema, e que você não é a pessoa tão perfeita que pensava ser.

E com o tempo, começa a nascer aquela chama no seu coração de buscar melhorar – não pra se vingar do oponente, mas pra entender como tudo aquilo é possível. Você quer aprender a durar mais no rola sem ser finalizado. Depois, quer controlar o gás durante o treino. Depois, aprende novas formas de derrubar o adversário. Meses ou anos depois, você começa a dominar a base com fundamentos – e percebe que é só o começo de uma jornada que durará até o seu último dia, e que impactará todos os aspectos da sua vida.

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